Transformando vidas: o impacto do trabalho do assistente social na política habitacional

Seso Notícias convida a Assistente Social Juliana Pimentel para compartilhar suas experiências e reflexões na área da habitação.

Em comemoração ao Mês do Assistente Social, celebrado no dia 15 de maio, nada mais justo do que homenagear os profissionais que atuam com objetivo de contribuir para a garantia de direitos e a justiça social.

Para tanto, neste mês convidaremos alguns assistentes sociais que atuam em diversas áreas para apresentar os diferentes espaços socio-ocupacionais que podem ter assistentes sociais em seus quadros funcionais.

Para esta segunda entrevista, convidamos a assistente social Juliana Pimentel, que possui uma grande experiência na Política Social de Habitação para compartilhar suas experiências e reflexões sobre a importância da profissão neste campo profissional tão necessário para a população.

Juliana Pimentel é graduada em Serviço Social pela Universidade Federal Fluminense (UFF), mestre em Políticas Públicas e Formação Humana (PPFH/UERJ), Especialista em Planejamento Urbano e Regional (IPPUR/UFRJ).

É assistente social da Prefeitura Municipal de Belford Roxo há 14 anos. Atuou por mais de uma década na Secretaria Municipal de Habitação e Urbanismo do município, sendo responsável técnica pelo Trabalho Social nos condomínios do Programa Minha Casa, Minha Vida da cidade.  

No campo da habitação e urbanismo foi coordenadora de Trabalho Social da Secretaria Municipal de Habitação da Prefeitura de Queimados – SEMUHAB/PMQ, no período de dez/2014 até julho/2020. Diretora de Trabalho Social na Subsecretaria de Habitação de Duque de Caxias/PMDC (2013).

Atualmente, além de servidora pública, é consultora de projetos na OSC Casa da Cultura de São João de Meriti.

Trajetória e Motivação

SN: Conte-nos sobre sua trajetória profissional. O que a motivou a seguir a carreira de assistente social e, posteriormente, a se dedicar à área da habitação?

A minha trajetória profissional no campo da habitação iniciou durante a graduação, no estágio curricular em Serviço Social, no qual fui estagiária da Secretaria Municipal de Habitação da Prefeitura do Rio de Janeiro.

Ao longo de dois anos participei do Programa “Morar Legal” voltado à regularização de loteamentos, prioritariamente na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Esta experiência foi objeto de estudo na minha monografia, na qual discuti os desafios e possibilidades do Trabalho Social na habitação, tendo como foco a ação profissional no loteamento Jardim Nossa Senhora das Graças na Zona Oeste.

Após a formação atuei como assistente social em empresas de engenharia na prestação de serviços de regularização fundiária e de obras em diversas comunidades do Rio, especialmente a partir do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em 2007.

Basicamente, este foi meu início profissional na área da habitação. De lá para cá todos os meus trabalhos foram no campo habitacional, desenvolvendo práticas diversas, como ações de campo, de atendimento direto aos usuários, em outros momentos de gestão, de monitoramento, de fiscalização de contratos e etc.

Ao falar um pouco desta trajetória é relevante notar que mais comumente as assistentes sociais atuam em outras áreas profissionais, sobretudo na Assistência Social, antes de enveredar na habitação. No meu caso, eu comecei e prossegui ao longo de quase duas décadas nesta mesma seara de intervenção. Houve alguns trabalhos, inclusive bastante importantes para minha caminhada profissional, no campo ambiental, da assistência social e, mais recentemente, em direitos humanos, contudo, a questão habitacional sempre foi o meu principal objeto de trabalho.

SN: Quais foram os principais desafios e aprendizados que você vivenciou ao longo da sua jornada?

São muitos os desafios colocados à prática profissional do Assistente Social no campo habitacional. Um dos principais desafios é promover um processo qualificado, socialmente seguro e ético de acesso da população ao serviço, dada a ampliada demanda por moradia e a insuficiente oferta de ações do Estado.

Uma das principais estratégias que aprendi ao longo dos anos para garantir uma gestão eficiente da demanda é atuar de forma articulada com os diferentes setores da administração pública, sobretudo aqueles afetos aos serviços sociais básicos, com intuito de reunir informações, dados relevantes para qualificação dos pareces técnicos, atendimentos e inserção dos usuários nos serviços ou oferta de benefícios habitacionais. Além disso, primar por um processo de trabalho claro e referenciado às demandas locais, de acordo com as características de cada grupo de moradores e respectiva territorialidade.

SN: Descreva um dia típico de trabalho como assistente social na área da habitação. Quais são as principais atividades desenvolvidas?

As atividades profissionais de um assistente social em seu cotidiano são muito determinadas pelo tipo de programa ou ação habitacional no qual está inserido, tendo em vista que a depender da intervenção habitacional, mudam-se as rotinas, formas de atendimento ao público e etc.

Por exemplo, em programas de reassentamento de populações, no geral, a maior parte dos atendimentos sociais e trabalho com os moradores ocorre diretamente no território. 

Em Programas de Concessão de Aluguel Social, no entanto, embora haja um importante trabalho de campo, de visitas domiciliares, o assistente social é muito demandado á produção de pareces, de relatórios, e outras rotinas internas relacionadas à concessão do benefício.

No entanto, pode-se dizer que, independente do tipo de programa ou intervenção no qual o AS está inserido, é patente a necessidade de uma ação direta no território para conhecer o local e as condições habitacionais da população, além de um trabalho permanente de escuta e de acolhimento dos moradores, seja de forma individualizada ou coletiva.

SN: Como você caracteriza o trabalho do assistente social com a população de baixa renda nos conjuntos habitacionais?

É um trabalho importantíssimo, necessário a consecução do direito à moradia de forma ampla, sendo fundamental para garantir o acesso da população aos serviços de assistência social, saúde, educação, entre outros, no entorno dos conjuntos habitacionais e na apropriação do bairro e da cidade como um todo.

SN: Quais são as principais intervenções do assistente social na garantia da moradia digna, desde a seleção das famílias até o acompanhamento pós-moradia?

Considerando que o acesso à moradia digna pode ser beneficiado por diversos tipos de intervenção, desde melhorias habitacionais até a construção de novas moradias, há algumas diferenças na inserção profissional.

Contudo, pode-se dizer que o Trabalho Social deve ocorrer em todas as etapas da operação, desde sua fase preliminar, antes mesmo do projeto ou programa iniciar, com ações de mobilização, comunicação e participação comunitária; ao longo do projeto – garantindo o acesso das famílias em situação de maior vulnerabilidade social e habitacional; e ao final, em ações de acompanhamento social, monitoramento e avaliação.

SN: O trabalho em equipe pode contribuir para a superação dos desafios e para a promoção de soluções inovadoras na área da habitação popular? Caso positivo, de que forma?

Sim! Neste âmbito de trabalho é muito comum a atuação em uma equipe multiprofissional, composta por arquitetos, engenheiros, advogados, entre outros.

Soluções inovadoras no campo habitacional podem ser absorvidas à medida que através do Trabalho Social a população, mobilizada, participante dos espaços de controle e discussão da política pública de habitação, possam opinar e discutir os projetos em execução, de forma que estes possam ser assimilados juridicamente, arquitetonicamente, física e socialmente à realidade socioterritorial desta população, com soluções construídas de forma coletiva e que atendam as necessidades da população.

SN: Quais são os principais desafios e as principais necessidades dessa população?

Além da moradia digna, um dos principais desafios e necessidades desta população encontra-se no acesso à infraestrutura urbana.

No geral, uma das principais problemáticas, que inclusive podem determinar a precariedade habitacional, que afeta a qualidade de vida de maneira direta, trata-se da ausência ou parco atendimento ofertado pelo poder público em relação ao conjunto básico de serviços como água, luz, transporte público, rede de esgoto, sobretudo em áreas periféricas, favelas e assemelhados.

SN: De que forma você busca fortalecer a autonomia e a organização social das comunidades em situação de vulnerabilidade?

Atuando de forma permanente na construção de espaços de participação popular, na mobilização de grupos e referências comunitárias, e por meio de um trabalho forte de comunicação e socialização de informações junto aos usuários.


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Tempo de Atuação e Mudanças Percebidas

SN: Há quanto tempo você trabalha na área da habitação?

18 anos.

SN: Ao longo desse tempo, você percebeu mudanças nas políticas públicas de habitação e no perfil das famílias atendidas?

Sim. Ao longo de quase duas décadas de atuação foram muitas as mudanças percebidas no campo das políticas urbana e habitacional.

Em relação às normas e legislações, por exemplo, destaca-se o Estatuto da Cidade, em 2001, (Lei Federal nº 10.257/2001), que estabelece diretrizes gerais para o desenvolvimento urbano, como a função social da propriedade, a gestão democrática das cidades e a garantia do direito à moradia.

Em seguida, a Política Nacional de Habitação, Lei 11.124/2005, e o Plano Nacional de Habitação (PlanHab) – 2009-2023, que estruturou o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social.

Em relação ao perfil das famílias atendidas, foi possível verificar tanto à partir da legislação acima citada, como também através dos Programas Federais, especificamente, o Programa Minha Casa, Minha Vida, uma dinâmica concreta de absorção de famílias e usuários pauperizados, sem necessidade de renda ou vínculo empregatício formal para entrar no sistema de financiamento habitacional.

A priorização de mulheres para concessão da casa própria. A adequação arquitetônica para atender deficientes físicos e idosos. Estes são alguns dos aspectos que promoveram mudanças no público desta política pública, anteriormente mais restrito e menos inclusivo do ponto de vista social.

SN: Quais os principais avanços e retrocessos que você observa na área?

Dentre os principais avanços, cito a ampliação das frentes de atuação na habitação com requisição de assistentes sociais.

Quanto aos retrocessos, podem ser descritas práticas de esquadrinhamento e educação disciplinadora que são muitas vezes empreendidas em áreas populares e junto à populações de baixa renda, infelizmente, por projetos profissionais que se pautam ainda por visão estigmatizada da população pobre.

SN: Como você avalia o impacto do seu trabalho na vida das famílias que você acompanha?

Os impactos são de curto, médio e longo prazos.

De curto prazo, posso dizer que são o acesso à moradia digna e aos serviços da rede de proteção social.

De médio e longo prazos, o impacto ocorre a partir do processo de intervenção socioeducativo desenvolvido, pautado na autonomia, na organização social e na participação da população para reivindicar permanentemente processos de cuidado e manutenção dos bens e serviços, como também a organização coletiva para lutar por avanços e melhorias no ambiente em que vivem.

Aspectos Positivos e Negativos da Atuação

SN: Quais os aspectos mais motivadores e gratificantes da sua atuação como assistente social na área da habitação?

O acesso ao direto à moradia e a melhoria da qualidade de vida da população, sem dúvida, são os aspectos motivadores e mais gratificantes.

SN: Na sua opinião, quais são as principais perspectivas para o futuro da profissão do assistente social na área da habitação?

A atuação do assistente social neste campo tem sido cada vez mais requisita enquanto prática profissional especializada. É uma área em expansão.

Contudo, o Serviço Social precisa pleitear e disputar o seu espaço nesta área, que vem sendo relativizada para absorção de outros profissionais das ciências sociais aplicadas.

Nós, assistente sociais, historicamente estamos atuando em favelas, nos movimentos sociais de bairros, de loteamentos, nos mais diferentes territórios. Nós acumulamos cientificamente e também operacionalmente o conteúdo, repertório e instrumentais profissionais que dão à categoria não só as condições, mas a necessária capacidade técnica de operacionalizar o Trabalho Social no campo da política habitacional e urbana e seus mais diferentes programas.

SN: Que conselhos você daria para os estudantes que desejam seguir carreira nessa área?

Para os estudantes que desejam seguir a carreira atuando no campo habitacional e urbano é necessário ampliar e aprofundar a leitura, os estudos tanto das leis e das normas, como também de temáticas transversalizadas, como as discussões acerca dos movimentos sociais, do desenvolvimento territorial, da questão urbana, da urbanização. Acessar autores e referências teóricas da geográfica, da história, da sociologia, ou seja, de áreas diversas, sem, contudo, perder de vista os referenciais teóricos, metodológicos, operacionais, e, principalmente, éticos do Serviço Social.

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